sábado, 21 de abril de 2012

...A macieira

Quando é que eu irei morrer? Isto não é um texto sobre a vida antes da morte, mas da morte depois da vida. Se eu me pudesse ir buscar ao passado, para ver o futuro, ao dia em que o meu corpo estaria gelado, sem vida, um corpo de boneco, em que as pálpebras se abrem com o nosso dedo, em que o ar não se movimenta na boca, no nariz, nos pulmões; em que o coração está imóvel, um boneco, em rigor mortis, o que pensaria? Toda a vida que tive foi apagada porque a central fechou. Toda a genica de moço, a inteligência de adolescente, a sensatez de adulto e a serenidade de velho desapareceram; para se tornarem num pedaço de carne como os que vemos no talho, sem vida, sem correntes de sangue, sem ar, sem nada, NADA! Sessenta, setenta, oitenta, noventa anos de vida! Para no fim sermos um peso morto assente em algo. Sermos uma cabeça que é beijada com misturas de lágrimas na boca, sermos uma cabeça que é acariciada por mãos que tremem e que sentem a nossa falta. Uma cabeça que já esteve quente, fria, com terra, com neve, uma cabeça que já teve chuva a escorrer por ela abaixo e que me fazia sentir vivo. E agora estou morto e não vos sinto. Podem chorar, podem gritar que nem os meus ouvidos ouvem! Podem me apertar a mão que eu não o vou retribuir, vou simplesmente continuar imóvel, á espera que peguem em mim, me vistam e me ponham numa caixa fechada debaixo da terra, centímetros abaixo de vocês aí em cima, que me põe flores e se recordam da energia que corria nos meus músculos e das coisas que fazia quando existia. Porque eu agora não existo. Queria um beijo teu avô, de despedida. Queria ouvir-te chamar por mim, tamanho egoísmo meu. Queria que me ensinasses mais sobre o campo de que eu tanto gosto. Queria que existisses, bem, saudável, para mim. Queria-te aqui, mas agora não posso. Obrigado. Um beijo. Amo-te e um dia quero voltar a encontrar-te, e aí iremos juntos apanhar maças.